Tem sido dado grande destaque, na comunicação social, às consequências das alterações do novo sistema de contas nacionais no cálculo de variáveis económicas de grande relevância, como o PIB, o défice público e a dívida pública. A mais significativa é o aumento do PIB num valor que o INE admite exceder os 2%. Esta situação pode gerar confusão na opinião pública num contexto em que se multiplicam as intervenções de membros do Governo no sentido da melhoria da situação económica, num quadro em que os efeitos da “austeridade” estão a empobrecer os trabalhadores, a generalidade da população e o país, em particular com os cortes nos salários e nas pensões (ontem mesmo a Assembleia da República discutiu um Orçamento de Estado Rectificativo que corta o valor das pensões através da Contribuição Extraordinária de Solidariedade e aumenta os descontos para a ADSE).

A mudança de regras da contabilidade nacional não acontece apenas em Portugal. Processa-se a nível global, no âmbito das Nações Unidas e da União Europeia. As alterações metodológicas que o INE irá aplicar decorrem do novo Sistema Europeu de Contas (SEC2010) que entrará em vigor em Setembro deste ano.    

Os impactos da alteração das regras estatísticas no PIB, no défice e na dívida pública não são ainda totalmente conhecidos e vão em sentidos que nem sempre coincidem. Assim, se por um lado o PIB aumenta, o mesmo poderá também acontecer com a dívida pública em resultado da reclassificação de algumas entidades no âmbito das Administrações Públicas (são referidas a Parpública, a Sagestamo, a EDIA, os hospitais-empresa e empresas municipais). Por outro lado, as receitas e despesas relacionadas com as transferências de fundos de pensões para a segurança social deixam de contar para o cálculo do défice público.

Um dos impactos mais importantes situa-se ao nível do PIB com um aumento que o INE estima que possa exceder os 2%, segundo informação publicada na comunicação social. Este aumento resulta sobretudo da contabilização como investimento, e não meramente como um custo, das despesas com a investigação e desenvolvimento. Aliás, se o país investisse mais em investigação e desenvolvimento (ID) teria um nível de PIB ainda superior, aplicando estas regras. Existem outras alterações metodológicas de duvidoso mérito que determinam o aumento do PIB, como seja a aquisição de material militar.

Não se pode confundir aumento do PIB com a sua variação, ou seja o seu crescimento (ou decrescimento, isto é, a recessão). Se o PIB aumenta em 2014 devido a esta razão então o mesmo teria também acontecido nos anos anteriores aplicando a mesma metodologia. Ora o INE irá proceder ao recálculo do PIB desde 1995 e, apesar do desinvestimento em ID, não é de esperar alterações significativas na variação do PIB, de acordo com informação divulgada na comunicação oficial. Neste sentido, é de combater a ilusão que visa criar um novo milagre das rosas em que da recessão se passa ao crescimento devido à magia das novas regras contabilísticas.

Lisboa, 23.01.2014