O regulamento dos Artistas de Rua no Porto está a ser implementado de forma abusiva pelos serviços da Câmara Municipal do Porto, resultando em graves prejuízos para os artistas, não só impedidos de trabalhar, como obrigados a adquirir equipamentos novos que, apesar de estarem de acordo com o que o regulamento estipula, são chumbados sucessivamente pelos serviços. O CENA-STE – Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos divulga o comunicado seguinte, que foi também encaminhado ao Executivo Municipal e à Assembleia Municipal do Porto.
O sindicato CENA-STE mantém-se atento à implementação do regulamento dos Artistas de Rua, o qual continuamos a considerar uma medida abusiva e inconstitucional, limitadora de liberdades e direitos fundamentais. Nesta implementação temos encontrado, infelizmente, cada vez mais motivos de preocupação e a confirmação de que todo o processo foi mal conduzido, mal informado e mal intencionado. Após a aprovação do regulamento, são vários os sinais de que houve grandes falhas neste processo, em que não se quis dar ouvidos às partes que conhecem a atividade artística de rua e que sempre se mostraram disponíveis para ajudar a retirar das sucessivas propostas regulamentares os seus vícios e os seus erros. Neste momento, estamos a assistir a situações muito graves que não podemos deixar sem denúncia, e que exigem a assunção de responsabilidades por quem aprovou o regulamento, tanto no Executivo Municipal, como na Assembleia Municipal.
Não tendo sido acautelado um período de aplicação progressiva do regulamento, nem tomada qualquer medida para esse efeito após a nossa comunicação ao executivo ainda antes da entrada em vigor, há dezenas de artistas impedidos de trabalhar e sem rendimentos enquanto esperam pela licença, pedida nos primeiros dias em que tal foi possível.
O processo de verificação e validação dos amplificadores está a revelar falhas gravíssimas e intoleráveis. Os músicos foram chamados para verificar os equipamentos e foram confrontados com sucessivas decisões contraditórias: aprovação, nova chamada e desaprovação em massa, naquilo que parece ser uma testagem à medida (ver pontos seguintes) para retirar o maior número possível de artistas da rua.
A validação não se limita a verificar os 50W de potência dos equipamentos. Diga-se que esta definição arbitrária de uma potência nominal de nada serviria, apenas se destinou a obrigar os artistas a gastar largas centenas de euros em equipamento, sendo este, muitas vezes, desadequado para as suas prestações musicais, e sem nenhuma garantia de que seria aprovado pelos serviços da câmara. E, de facto, tem acontecido os equipamentos serem chumbados, apesar de estarem de acordo com as especificações do regulamento.
A aprovação com imposição de selo lacrado e posterior desaprovação com retirada do selo levou inclusivamente à danificação de equipamentos novos, resultando na impossibilidade de serem devolvidos e em grandes prejuízos para os músicos, por exclusiva responsabilidade dos serviços camarários.
Os equipamentos estão a ser chumbados quando são alimentados por bateria externa, quando nada no regulamento impede as baterias externas, apenas a alimentação pela rede elétrica ou por gerador. Uma bateria não é um gerador de energia, é um acumulador. Por desconhecimento ou por má-fé, está a obrigar-se os artistas a mais do que o próprio regulamento obriga.
É feita uma testagem da pressão sonora emitida em dB(A) através de um processo altamente questionável:
O teste é feito num local completamente silencioso, que contrasta radicalmente com os locais de trabalho dos artistas de rua, onde o ruído da rua já se aproxima ou mesmo ultrapassa os limites impostos aos artistas.
Neste teste, os técnicos obrigam à colocação do volume do amplificador no máximo, sabendo que nunca nenhum amplificador de instrumento é usado no volume máximo, nem tal traz qualquer vantagem para a qualidade sonora que os músicos procuram.
Os técnicos têm realizado este teste com a imposição de um áudio externo por eles escolhido, que é posto a tocar no volume máximo. Sabendo-se que um áudio externo é geralmente masterizado em 0dB(A) e a entrada de instrumentos tem um sinal de -12dB(A) ou mesmo -24dB(A), obviamente que o sinal de um áudio externo resulta numa pressão muitíssimo superior à de um instrumento ligado ao mesmo amplificador.
Acresce que inserção de um áudio externo tem sido feita através de um telemóvel comum, por bluetooth, e não através de um gerador de sinal acústico devidamente certificado para o efeito, pelo que nunca poderia ter qualquer validade técnica.
Frequentemente este áudio externo não tem qualquer relação com o estilo musical do artista, podendo ser uma faixa de rock pesado que, juntamente com a colocação do ganho do amplificador no nível máximo, nos leva a concluir que há a clara intenção de impor um resultado superior aos 75dB(A) e de chumbar o maior número possível de artistas.
Não existe nenhum amplificador no mercado que, nestas condições, mantenha o volume emitido abaixo dos 75dB(A). Tal não poderia sequer ser considerado um amplificador.
Com estes métodos será praticamente impossível a aprovação de um amplificador que esteja em condições de tornar um músico audível na rua.
É este o objectivo do regulamento? Reprimir a arte de rua do Porto?
Para tal, será necessário desgastar os artistas, obrigá-los a sucessivos investimentos de muitas centenas de euros em equipamento inútil, e a inspecções humilhantes, para depois serem descartados pelo município?
Haverá no Executivo Municipal e na Assembleia Municipal algum respeito pela arte de rua, a que no regulamento se insistiu, sintomaticamente, em chamar de 'animação'?
O sindicato CENA-STE não concordou com este regulamento, que não teve em conta a maior parte das nossas propostas, e deplora a sua aplicação com claro intuito de proibir, de facto, uma actividade que valoriza a cidade.
E sublinhamos a permanente postura de colaboração dos artistas, que se têm sujeitado a tudo isto com elevação e sentido de responsabilidade.
Esperamos que o Executivo Municipal e a Assembleia Municipal do Porto assumam também as suas responsabilidades, terminando com métodos abusivos de uma regulamentação que já tem suficientes defeitos e não precisa que mais lhe sejam acrescentados.