acidentesINCUMPRIMENTO DAS NORMAS DE PREVENÇÃO ESTÁ NA ORIGEM DAS ALTAS TAXAS DE SINISTRALIDADE LABORAL QUE PERSISTE EM MANTER-SE EM PORTUGAL
Portugal continua a ser um dos países da União Europeia com mais elevadas taxas de sinistralidade laboral, muito embora nos últimos anos se tenha tentado mascarar esta realidade, afirmando repetidamente que o número de acidentes de trabalho tem descido continuamente.

Comunicado de Imprensa n.º 008/08

 

INCUMPRIMENTO DAS NORMAS DE PREVENÇÃO

ESTÁ NA ORIGEM DAS ALTAS TAXAS DE SINISTRALIDADE LABORAL

QUE PERSISTE EM MANTER-SE EM PORTUGAL

 

Portugal continua a ser um dos países da União Europeia com mais elevadas taxas de sinistralidade laboral, muito embora nos últimos anos se tenha tentado mascarar esta realidade, afirmando repetidamente que o número de acidentes de trabalho tem descido continuamente.

 

A verdade é que os números publicados pelas diferentes instituições sobre os acidentes de trabalho se contradizem mutuamente e que os nossos indicadores estatísticos são diferentes dos utilizados a nível europeu, designadamente no âmbito do Eurostat; se procedermos a um cruzamento de dados, facilmente verificaremos que os números nacionais são muito mais elevados do que nos querem demonstrar.

 

Por outro lado, como nos mostra a simples observação da realidade, nos últimos meses o número de acidentes de trabalho, com particular destaque para os mortais, recrudesceu, designadamente nos sectores da construção civil e dos transportes.  

 

 

Dados da Inspecção do Trabalho falseiam a realidade

 

A divulgação pública efectuada periodicamente pela IGT do número de acidentes mortais não reflecte minimamente, infelizmente, a realidade existente; a IGT procura fazer passar uma ideia de que se está a caminhar no bom sentido, ou seja, da aplicação da lei e dos princípios gerais da prevenção de riscos nos locais de trabalho quando, afinal, o que acontece muitas vezes é exactamente o contrario, isto é, o incumprimento reiterado por parte dos patrões e a inoperância da própria Inspecção do trabalho.  

 

Apesar da IGT registar em 2007 um aumento do número de acidentes mortais, relativamente ao ano anterior, o facto é que a realidade é muito pior, é mesmo dramática. No quadro abaixo pode ver-se que no período 2001-2004 os níveis de acidentes totais, acidentes mortais e dias de trabalho perdidos devido a acidentes, com base na estatística do GEP/MSST, mantêm-se aos mesmos níveis da década de 90. Caso fosse possível cruzar estes indicadores com a estatística do Ministério da Justiça ver-se-ia, então, que a situação é ainda mais grave, no entanto o MJ deixou de disponibilizar os dados das acções em Tribunal referentes aos acidentes de trabalho. 

 

Por outro lado, a taxa de incidência dos acidentes também se mantém muito elevada (nº de acidentes por cada 100 mil trabalhadores) uma vez que tem diminuído a taxa de actividade económica em diversos sectores e, consequentemente o número de trabalhadores em actividade.    

 

Ano

Total Acidentes

Total Dias Perdidos

Total Acidentes Mortais

 

 

 

IGT

GEP/MSST

2001

244.936

7.738.961

280

365

2002

248.097

7.624.893

219

357

2003

237.222

6.304.316

181

312/346 *

2004

234.109

 

197

306

 

Fonte: GEP/MSST (não estão disponibilizados dados depois de 2004)

            IGT (acidentes mortais)                                                            * Registados na estatística da OIT

 

Neste contexto, concluímos que o panorama dominante continua a ser bastante preocupante para que não deixemos de chamar permanentemente a atenção sobre o que é necessário fazer para reduzir rapidamente e de modo eficaz a sinistralidade laboral.

 

No campo legislativo, Portugal dispõe de um quadro legal razoavelmente completo e coerente, integrando os instrumentos internacionais e comunitários relativos à prevenção dos riscos profissionais e à protecção da saúde e segurança no trabalho.

 

Portanto, o problema não reside na ausência ou insuficiência de legislação adequada.

 

A elevadíssima sinistralidade no trabalho deve-se sobretudo:

 

Ø     Ao generalizado incumprimento das normas de prevenção e de protecção da segurança e saúde no trabalho, por insuficiente fiscalização e falta de vontade política para as fazer cumprir;

 

Ø     Ao mau funcionamento, ou mesmo inexistência, dos serviços de prevenção nas empresas, devido à irresponsabilidade da classe patronal que continua a considerar a prevenção dos riscos como um custo que é preciso evitar;

 

Ø     À imposição crescente de horários de trabalho excessivamente prolongados e ritmos acelerados de trabalho;

 

Ø     À proliferação de trabalho precário e ilegal;

 

Ø     Ao diminuto investimento na formação dos trabalhadores, que muitas vezes conhecem insuficientemente o trabalho e os respectivos riscos devido a não serem correctamente informados e preparados nesse domínio.

 

A redução da sinistralidade laboral passa, em primeiro lugar, pela promoção e generalização das actividades de prevenção de riscos profissionais nos locais de trabalho, o que pressupõe uma prévia interiorização da ideia de que os riscos profissionais não constituem uma inevitabilidade ou fatalidade inerentes à própria actividade, mas sim algo que pode ser eliminado ou evitado mediante o desenvolvimento de determinadas actividades orientadas para esse fim: as actividades de prevenção dos riscos profissionais, que devem começar logo na concepção das instalações, dos locais e dos processos de trabalho e integrar todo o conjunto de actividades da empresa, incluindo a organização do trabalho, tendo em conta factores como os horários de trabalho, o stress e outros factores de natureza psicossocial causados por ritmos muito intensos.

 

Um segundo aspecto a considerar é que os riscos profissionais e a respectiva prevenção são da inteira responsabilidade das entidades empregadoras enquanto beneficiárias da actividade desenvolvida, o que tem desde logo uma importante consequência: as entidades empregadoras estão obrigadas a assegurar aos trabalhadores condições de segurança, higiene e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho, tomando e aplicando todas as medidas para tanto necessárias, incluindo o planeamento da prevenção na empresa em todos os momentos e fases do processo produtivo.

 

Portanto, a chave do combate à sinistralidade laboral, o seu campo privilegiado de acção, está na prevenção dos riscos profissionais e a responsabilidade pelo seu desenvolvimento cabe, em primeira instância, às entidades empregadoras.

 

Infelizmente, na grande maioria das empresas o investimento na prevenção e na protecção da segurança e saúde dos trabalhadores continua a ser encarado como mais um custo indirecto do trabalho, que é necessário minimizar, mesmo que seja à custa da vida e da integridade física dos trabalhadores. A ideia de que o investimento na prevenção pode ser compensatório e inclusive ter efeitos positivos ao nível da produtividade e competitividade das empresas ainda não foi assimilada.

 

Por outro lado, o incumprimento das normas de prevenção e protecção da segurança e saúde no trabalho tem sido potenciado por um sentimento geral de impunidade; a falta de uma fiscalização constante e adequada por parte das entidades competentes, o diminuto valor relativo das coimas aplicadas pela sua violação e, sobretudo, o facto de as condutas violadoras (e eventualmente geradoras de acidentes de trabalho, de mortes e incapacidades) não serem objecto de um juízo de desvalor ou censura ética suficientemente forte, têm contribuído para fomentar a ideia da fatalidade dos acidentes de trabalho, que acabam por ser considerados como ocorrências lamentáveis, mas pelas quais ninguém pode ser realmente responsabilizado.

 

Regra geral, a conexão causal directa existente entre a ocorrência de acidentes de trabalho e a falta de organização e desenvolvimento de actividades de prevenção nas empresas e locais de trabalho, o incumprimento das regras e condições legais de segurança e as deficientes condições de trabalho proporcionadas aos trabalhadores, designadamente em termos de organização do tempo de trabalho, não é suficientemente enfatizada.

 

       As alterações que o patronato reclama introduzir

     na revisão do código do trabalho agravariam

    drasticamente a sinistralidade no trabalho

 

As estatísticas mostram também que as probabilidades de ocorrência de acidentes de trabalho, particularmente em sectores considerados de alto risco, aumentam consideravelmente em situações de trabalho precário, porque nessas situações, por natureza violadoras dos mais elementares direitos laborais e humanos, nenhum respeito existe pelas regras de segurança no local de trabalho e a pressão exercida a todos os níveis sobre os trabalhadores nestas situações potencia a existência de riscos acrescidos, susceptíveis de originarem acidentes. 

 

É por isso incompreensível que de entre as propostas que o patronato reclama ao Governo para que sejam introduzidas no código do trabalho, as quais constam do livro branco das relações laborais, estejam precisamente aquelas que visam impor a precariedade como regra no mundo do trabalho e criar um sistema de flexibilidade de horários (duração dos períodos de trabalho até 16 horas, por ex.,) e de mobilidade funcional e geográfica que deixaria os trabalhadores completamente desarmados face à imposição de todo o tipo de arbitrariedades.

 

Caso o patronato viesse a alcançar aqueles objectivos, isso significaria não só um brutal ataque aos direitos dos trabalhadores, mas também uma tremenda machadada no sistema de prevenção de riscos profissionais que se tem procurado desenvolver e consolidar ao longo dos anos. Mas porque esses mesmos objectivos colidem frontalmente com o cumprimento das leis que respeitam à prevenção da segurança e da saúde dos trabalhadores, o Governo que porventura aceitasse uma tal monstruosidade teria de assumir o facto gravíssimo de, em nome do Estado Português, violar ele próprio as leis nacionais e internacionais e, como tal, ser responsabilizado, com todas as consequências que adviriam desse acto condenável.    

 

O que o país precisa e os trabalhadores exigem, não é mais precariedade nem piores condições de trabalho que lesam gravemente a saúde das pessoas. Pelo contrário, no actual contexto a CGTP-IN entende que o combate firme à precariedade laboral constitui factor determinante para reduzir os riscos profissionais, sendo igualmente urgente e necessário que as entidades públicas competentes nesta matéria comecem finalmente a agir de forma mais drástica, de modo a deixar bem claro às empresas, de uma vez por todas, que:

 

·          A protecção da segurança e saúde dos trabalhadores é uma prioridade absoluta, envolvendo o respeito por direitos fundamentais como o direito à vida, à saúde e á integridade física.

 

·          A legislação em vigor em matéria de prevenção dos riscos profissionais é para ser integralmente cumprida.

 

·          As empresas que não cumpram as normas serão efectivamente responsabilizadas e punidas pelas infracções cometidas e pelos acidentes de trabalho que dai resultarem.

 

 

DIF/CGTP-IN

Lisboa, 30.01.2008