850A atribuição de uma compensação às empresas pelo aumento do salário mínimo é uma prática iniciada pelo Governo PSD/CDS-PP em 2014 que o Governo do PS retomou em 2016, apelidando-a de medida de apoio ao emprego, com base na ideia – que a realidade se encarregou de negar abundantemente – que o aumento dos salários impede a criação de emprego e afecta a competitividade das empresas.

Na verdade, esta prática corresponde apenas a mais uma forma de financiamento das empresas, desresponsabilizando-as do cumprimento de uma obrigação exclusivamente sua, que é o pagamento dos salários dos trabalhadores ao seu serviço.

Além disso, a compensação atribuída tem assumido a forma de isenção de uma parte da contribuição para a segurança social devida pelas entidades empregadoras que, sendo financiada em partes iguais pelo Orçamento do Estado e pelo Orçamento da Segurança Social, onera de forma abusiva as contas públicas e, em particular, a sustentabilidade do sistema público de segurança social.

Note-se por fim que a prática de atribuir esta compensação às entidades patronais foi interrompida em 2017 pela intervenção da Assembleia da República, que nesse ano resolveu cessar a vigência do diploma que, mais uma vez, previa uma “medida excepcional de apoio ao emprego através da redução da taxa contributiva a cargo da entidade empregadora”.

E eis que em 2021 a mesma prática está de regresso.

A pretexto da pandemia e da crise económica e social dela resultante, o Governo propõe-se de novo compensar as entidades patronais pelo aumento do salário mínimo, desta vez não através de uma redução da taxa contributiva, mas mediante a atribuição de um apoio directo.

Assim, de acordo com o estabelecido no Decreto-Lei 37/2021, esta é uma medida excepcional de compensação ao aumento do valor do salário mínimo, que consiste na atribuição de um subsídio pecuniário, pago de uma só vez, pelo IAPMEI ou pelo Instituto do Turismo de Portugal (consoante a CAE da entidade patronal), e financiada pelo Orçamento do Estado para 2021.

O subsídio tem o valor de € 84,50 por cada trabalhador que na declaração de remunerações relativa ao mês de dezembro de 2020 auferia como remuneração base o valor correspondente ao salário mínimo em vigor para 2020; no caso de trabalhadores cuja remuneração base se situava, segundo a declaração de remunerações relativa ao mês de dezembro de 2020, entre o valor do salário mínimo para 2020 e o valor do salário mínimo para 2021, o subsídio corresponde a metade do valor acima referido, ou seja €42,25.

A CGTP-IN discorda frontalmente desta prática e particularmente da ideia de que as empresas devem ser compensadas pelo aumento do salário mínimo, como se o pagamento de salários não fosse uma obrigação que lhes compete exclusivamente enquanto beneficiárias da prestação da actividade dos trabalhadores ao seu serviço.

O estabelecimento e actualização de um salário mínimo nacional é um direito fundamental dos trabalhadores, consagrado constitucionalmente, que compete ao Estado assegurar de modo a garantir um mínimo de sobrevivência condigna a todos os trabalhadores. Enquanto direito fundamental e tarefa do Estado, não deve ser usado como moeda de troca para a atribuição indiscriminada de benefícios, independentemente de os respectivos beneficiários carecerem de algum apoio, nomeadamente no contexto da situação pandémica e da crise económica e social.

Ao longo deste ano de pandemia, as medidas tomadas têm correspondido à canalização de apoios substanciais directamente para as empresas sem qualquer avaliação das suas reais necessidades, das perdas registadas ou dos postos de trabalho salvaguardados ou destruídos. E este é mais um exemplo desta política, que tem favorecido apenas as grandes empresas, em detrimento das micro e pequenas empresas e dos trabalhadores.

Além disso, o regresso desta medida renova expectativas de estabilização junto das entidades patronais, com reflexos negativos nos modos de contratação, nos salários oferecidos, na contratação colectiva e no combate à precariedade, e incentiva a crescente subsidiodependência das empresas, além de constituir uma espécie de prémio às entidades patronais que remuneram os seus trabalhadores pelo mínimo valor legalmente possível.

Em conclusão, a CGTP-IN discorda em absoluto do retorno desta medida, seja em que quadro for. Não existe qualquer motivo atendível que justifique que sejam os contribuintes, e logo os próprios trabalhadores, a financiar uma parte do aumento do salário mínimo, exonerando as empresas da sua principal responsabilidade.

Lisboa, 21.05.2021

DIF/CGTP-IN